Baigorri vê ‘equilíbrio’ em novo PL de regulação das redes

O presidente da Anatel, Carlos Baigorri, defendeu nesta segunda-feira, 7, o projeto de lei de autoria dos deputados Silas Câmara (Republicanos-AM) e Dani Cunha (União-RJ) para regulação de plataformas digitais, apresentado no final do ano passado. O novo PL indica a agência como uma das autoridades competentes para supervisão e fiscalização. 

“Na nossa opinião [Anatel], é um projeto de lei bastante equilibrado ao trazer obrigações e também a responsabilidade dos agentes”, disse, durante audiência pública no Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional.

O projeto, PL 4691/2024, foi protocolado em dezembro do ano passado, apresentado como uma alternativa ao PL 2630/2020 – proposta mais avançada em termos de tramitação, mas que ficou inviável diante da falta de consenso. O debate realizado nesta manhã, no entanto, refletiu a continuidade de algumas divergências. 

A proposta mais recente, e que inclusive foi citada em documento do governo enviado ao Congresso como possível caminho para discutir a regulação de plataformas, coloca a Anatel como responsável pela regulação de aspectos econômicos e regras submetidas aos marketplaces, mas garantindo também a atuação do Cade quanto à ordem econômica. Já a ANPD ficaria com a questão da responsabilidade das redes ou, como explicam os autores no projeto, o que for sobre o “caráter tido como mais sociológico”. 

O projeto exige das plataformas o tratamento preventivo contra crimes na internet, combinando dois tipos de medidas: “ações preventivas, nos termos de regulamentação, e ações corretivas, quando oficialmente notificados” pelas autoridades. A atuação seria impedir, por exemplo, a divulgação de conteúdos que incluam violação aos direitos autorais, induzimento à violência e crimes contra o Estado Democrático de Direito. 

Um dos pontos da proposta destacados por Baigorri é a chamada “desanonimização mediada”. Pela redação, a liberdade de expressão é garantida, mas “o anonimato é proibido em qualquer forma de manifestação do pensamento, devendo o autor identificar-se claramente”. A pessoa pode até indicar um pseudônimo, mas os dados reais devem estar verificados e mantidos em sigilo pelas plataformas, podendo ser requisitados por ordem judicial. 

Relacionado a isso, a plataforma poderia ser responsabilizada civilmente, de forma solidária, por danos decorrentes do conteúdo quando falhar em identificá-los e quando a distribuição tiver sido realizada por meio de anúncio. 

Anonimato no novo PL

O presidente da Anatel ressaltou que um dos exemplos do impacto positivo da identificação de usuários ocorreu no setor de telecom, quando as operadoras passaram a exigir a identificação de um CPF associado aos números por meio da Lei do Cadastro Pré-Pago (Lei nº 10.703/2003), já que a falta de tal vinculação favorecia mais fraudes. 

“Por uma lógica econômica, não há interesse nenhum por parte das plataformas de rede social de identificar os seus usuários. E aí nós temos um problema que se retroalimenta. Esse era um problema muito comum no setor de telecomunicações […] Hoje, você tem que dar nome, CPF, às vezes, biometria, então, aumentou a restrição para que um ‘número’ cometa um crime”, exemplificou Baigorri.

O presidente da agência também ressaltou a defesa da Anatel como órgão estratégico para a implementação da regulação, por já ser frequentemente demandado em atividades que envolvem o ecossistema digital, como o bloqueio de acesso a plataformas.

Além do projeto em si, Baigorri reforçou o posicionamento sobre a revisão do artigo 19 do Marco Civil da Internet. O dispositivo, que está em discussão no STF, prevê que “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente”.

Para Baigorri, a regra “simplesmente diz que as plataformas de rede social não são responsáveis pelo que trafega nas suas redes”, e que inclusive tem sido usado por marketplaces para afastar responsabilidade por produtos irregulares vendidos. 

“Não faz sentido você ter um ambiente assim de completa irresponsabilidade onde aquele que viabiliza a disseminação daquele conteúdo não tem responsabilidade nenhuma nem pelo conteúdo nem de identificar quem é que está distribuindo, produzindo. Ainda mais quando essa plataforma impulsiona esse conteúdo e é remunerada pelo engajamento […] Na opinião institucional da Anatel, [o artigo 19 do Marco Civil da Internet] cria problemas muito maiores não somente nas redes sociais, ele cria um ambiente de terra de ninguém em toda internet”, afirmou o presidente da agência.

Divergências

Renata Mielli, coordenadora do CGI.br, apresentou a proposta recentemente lançada pela entidade que defende uma responsabilização das plataformas proporcionais ao poder sobre a interferência no conteúdo, reconhecendo que há diferentes tipos de provedores. Concordou com a fala do Baigorri em separar o que é uma plataforma de rede social das demais, mas discorda que a questão do anonimato esteja no cerne da questão. 

“A identificação do usuário nas plataformas de rede social hoje é plenamente possível […] O nosso problema do debate público no ambiente digital não diz respeito à identificação do usuário, diz respeito ao modelo de negócios das plataformas e a prestação do serviço”, afirmou. 

Para o CGI.br as atuais regras do artigo 19 do Marco Civil da Internet devem ser mantidas para os provedores que não interferem ou possuem baixa interferência sobre os conteúdos dos seus usuários, com mudanças específicas para aqueles com alta interferência. 

Mielli discorda que a Anatel seja a melhor escolha de entidade regulatória. “A Anatel ainda não tem – pode ter um dia, talvez, mas hoje não tem  – experiência de regulação de conteúdo e isso é o grande problema que nós vivemos”, disse. 

“Eu compreendo que talvez uma dimensão dessa regulação e fiscalização possa caber à Anatel em alguns aspectos, principalmente no que diz respeito à infraestrutura, mas também há dimensões que deveriam ficar sob responsabilidade da ANPD, porque dizem respeito diretamente, por exemplo, ao perfilamento, a questões relacionadas à transparência dos algoritmos. Todos os aspectos de regulação econômica talvez precisem recair sobre órgãos de regulação de natureza dos mercados e econômica, o Cade, por exemplo”, defendeu. 

Outros participantes da audiência pública também saíram em defesa de uma estrutura “multissetorial” para a regulação da internet, entre eles, Bia Barbosa, integrante do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional  e também do CGI.br, como representante do Coalizão Direitos na Rede, e Tulio Chiarini, pesquisador do Ipea. 

Imagem principal: Audiência pública sobre plataformas digitais. Foto: Foto: Saulo Cruz/Agência Senado

 

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